O maior assentamento do Estado completou 25 anos com festa. O IBS atua por meio de Chamada Pública para o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Há seis meses o IBS realiza assistência técnica para cerca de 600 famílias do assentamento Reunidas, em Promissão-SP
Os preparativos da festa pelos 25 anos do Reunidas começaram no dia dois de novembro, com o município inteiro sem energia elétrica, mais de 12 mil consumidores ficaram por quase 20 horas sem o fornecimento de energia, um problema que segundo a concessionária responsável foi ocasionado pelo furto de três quilômetros de cabos da rede. “Mas deu tudo certo, vieram todos, pessoas que chinelaram (trabalharam) muito com a gente, agradecemos todos”, disse uma das mais antigas líderes locais, Maria de Lourdes Pereira. Violeiros e duplas sertanejas como a José Mulato e Cassiano participaram dos festejos com emoção e contação de histórias e Estórias do campo. O assentado e poeta, Luiz Beltrane foi homenageado por completar 104 anos de vida. “Eu sei plantar, eu sei capinar para fazer a reforma agrária, plantar e produzir”, recitou Beltrane, com lucidez e bom humor. Em dois dias de festejos, com missa, música, almoços e jantares, participaram mais de mil pessoas vindas de vários municípios brasileiros, deputado, vereadores e prefeitos eleitos, padres de diversas paróquias do Estado, representantes das diversas regionais do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terras, das CEBs – Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica, o bispo responsável pela diocese de Lins, Dom Irineu Danelon e o bispo Presidente da comissão nacional da Pastoral da Terra (CPT), Dom Enemésio Lazzaris. Presente também o Superintendente do INCRA, Wellington Monteiro Diniz, moradores da área urbana de Promissão e de toda a região, grupos de teatro e representantes do ITESP (Instituto de Terras do Estado de S.Paulo)
O IBS (Instituto Biosistêmico) colaborou com a organização do evento. O comércio local também participou. Quinze voluntárias, avós, mães, netas e bisnetas prepararam 150 quilos de carne, 40 quilos de arroz, legumes e saladas, quase cem quilos de sorvetes e 25 formas de 2,5 quilos de bolo de aniversário foram distribuídos. Para o diretor do IBS, Ricardo Cerveira, a experiência das famílias do Reunidas é essencial para o projeto do IBS. “O assentamento é muito grande, mas já realizamos (em assistência técnica), grande parte do estabelecido pela chamada pública com o INCRA”, explica.
Pessoas Reunidas – Dona Marina Barbero, 77 anos, morou em Promissão até os 19 anos quando se mudou para São Paulo, veio sozinha visitar o túmulo do avô, Miguel Barbero Gimenez. Marina disse à reportagem que achou muito corajosa a atitude dos sem terras ao ocuparem a fazenda Reunidas. “Quando meu avô tinha sítio aqui, a gente morria de medo dos Ribas (então proprietários da área), eles empurravam as boiadas para dentro dos sítios para depois comprar, com preço lá em baixo”, conta Marina. A fazenda Reunidas se formou com a pecuária, dizem que por bois bravos, provenientes do Mato Grosso. Em 1996 foi desapropriada pelo Governo Federal para fins de Reforma Agrária. Considerada como latifúndio improdutivo com seus pouco mais de 17 mil hectares, hoje abriga mais de 600 famílias que dividem a área em agrovilas, com casas construídas nos lotes, produzindo de grãos e leite a legumes e verduras, comercializados hoje com municípios distantes, da grande São Paulo. Hoje são 10 associações e três coopetativas, herança da antiga COPAJOTA, uma das primeiras experiências cooperativas em assentamentos no estado de São Paulo, fundada em 1992 e fechada em 1998 por desavenças, principalmente de fundo econômico. “Teve problemas inclusive em outras associações, mas não podemos dizer que o trabalho cooperativo não deu certo. A Copajota alavancou o movimento de cooperativas em todo o país, alavancou a ideia de cooperativismo no Brasil”, disse Padre Severino Diniz, há 18 anos vivendo em Promissão.
Padre Severino avalia que hoje os assentados recebem as políticas públicas no assentamento (atendimento por organizações não governamentais, universidades, instituições privadas, governo do Estado e governo Federal). “Agora estamos num novo momento de adaptação com a lei para ATER (Assistência Técnica e Extensão Rural). Aqui, nem escritório do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), a gente tinha. Agora tem a parceria do INCRA com os técnicos do IBS (Instituto Biosistêmico), também fazendo ATER, aproximando mais o técnico do assentado”, explica o padre. O Superintendente-SP do INCRA, Wellington Diniz, parabenizou os trabalhadores do Reunidas. “A reforma agrária é o caminho correto para construir um mundo melhor”, completou. O prefeito eleito de Promissão, Hamilton Foz (PT) também presente, contou à reportagem que vai criar uma secretaria da agricultura. “Vamos unir forças, por que a cidade não vive mais sem o assentamento e vamos incrementar nossa merenda escolar com os produtos do assentamento”, afirma. Duas feiras acontecem por semana no centro da cidade, produtos dos assentados, com preços em torno de 15% mais baratos em relação aos mercados.
Uma exposição sobre os 25 anos do assentamento chamou a atenção, quem era criança, quem era jovem se reconhecia nas antigas imagens. Na foto, o assentado Edson Aparecido Ferreira, 35 anos se reconhece aos nove anos de idade, quando ainda estava acampado. Hoje, o assentado produz verduras e frutas. Edson e o fotógrafo que o clicou ontem e hoje, Douglas Mansur, posam, em comemoração aos 25 anos do Reunidas: muitas lutas registradas para as novas gerações compreenderem que as conquistas dependem de continuidade. Em entrevista durante o evento, o bispo da CPT nacional, Dom Enemésio Lazzaris disse que a palavra que melhor explicava o presente nos assentamentos era “reprodução”, que os valores e ideais encontram barreiras para se reproduzirem entre os mais jovens. “Mas, estamos todos em um momento de grandes transformações”, conclui. Dom Irineu, bispo da diocese de Lins simbolicamente pediu durante a missa que todos beijassem as próprias mãos. “No que elas fazem de bom!”.
Para um veterano da reforma agrária, o assentado João Martiminiano de Carvalho, 77 anos, as coisas são claras. “A luta é a coisa que nos resta, pra qualquer situação”. Seu João, ao lado da mulher dona Francisca, conta que entrou na Reforma Agrária em 1964 e que escapou da morte várias vezes; antes de entrar para o MST
Uma das lideranças mais antigas do Reunidas, João Pereira, de 83 anos, se recuperando de um câncer, ainda dá conselhos. “Um motorista da Holambra amigo meu, aquela cooperativa das flores, me contou um dia como eles conseguiram. Ele me contou que se encontravam um cão machucado pelo caminho, paravam, recolhiam o animal e cuidavam em casa, por isso é que eles cresceram como estão, tem que ter carinho com tudo”, ensina .
HOMENAGEADO
Luiz Beltrame, poeta e assentado chega aos 104 anos com lucidez e alegria, dançou e cantou, conversou com todos durante a festa dos 25 anos do Reunidas. Nascido em Paramirim (BA) no dia 11 de outubro de 1908, trabalhou desde cedo na roça e no garimpo. Não frequentou a escola, aprendeu a ler e a escrever com seu pai aos 14 anos. Chegou ao Reunidas em 1991. É viúvo e pai de oito filhos, 47 netos, com bisnetos e tataranetos. Participou e ainda participa do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terras. Escreveu dois livros, foi tema de filme (Luiz Poeta, vencedor do Concurso Caixa de Curtas, na categoria documentário). Na foto, seu Luiz segura o informativo Notícias ATER que trouxe reportagem sobre sua vida e o assentamento Reunidas.
Onde fica – O assentamento é entrecortado pela rodovia federal BR 153 que liga Lins a São José do Rio Preto. É o maior assentamento realizado em área privada, de todo o Estado de São Paulo. Está localizado na região noroeste do Estado, 500 km da capital paulista, há 35 km do centro urbano de Promissão que registra em 2012 35 mil habitantes